sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Rotas da cerveja: bebida inspira roteiros turísticos tão variados quanto seus sabores e aromas

No Brasil, Minas Gerais se destaca com produção artesanal diversa. 
Na Região Serrana, fábricas são atrações 

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Enquanto a Europa é a guardiã de tradições centenárias, como as receitas dos monges trapistas belgas e os biergärten espalhados pela Alemanha, deste lado do Atlântico a graça é ver e provar a típica ousadia americana, que ajudou a mudar a cara de bairros como Lakeview, em Chicago, e Williamsburg, em Nova York. Em Ribeirão Preto, as fábricas já estão entre as principais atrações da cidade. Como em Petrópolis, turística por natureza, cujo segundo ponto mais visitado é a fábrica da Bohemia, atrás apenas do Museu Imperial.
O turismo cervejeiro também descobriu que em Minas Gerais há outros tipos de água imprópria para passarinhos. O estado é o segundo em produção de rótulos especiais — atrás de Santa Catarina — e registrou o maior número de novas cervejarias artesanais em 2013. Dizem que na terra da cachaça, sobretudo na Grande Belo Horizonte, são produzidos 55 dos 120 tipos de cerveja existentes no mundo. Uma “Bélgica brasileira”.
Até os tours especializados estão se multiplicando, muitos com direito a carro com motorista. Porque, mesmo de férias, se beber não dirija. Mas se viajar, beba. De preferência aquela cerveja que ficará marcada na memória, como um cartão-postal.

CERVEJA NA TERRA DO PÃO DE QUEIJO

Nas horas que precedem o almoço de domingo, os bares do Mercado Central, um dos símbolos de Belo Horizonte, fervem. Homens e mulheres se apertam nos balcões dos botecos, todos dominados pelas marcas da maior cervejaria do planeta. Todos? Não.
— Zé, me dá aquele de trigo aí! — pediu um impaciente freguês, antes de prestar consultoria de botequim ao vizinho de balcão. — Esse vai bem com o jiló frito.
Aquele de trigo é um dos três tipos de chope que o Botiquin do Antônio serve. O bar só vende bebidas da Cervejaria Bäcker, uma das pioneiras da cena das cervejas especiais de Minas Gerais. A presença de uma marca local em um reduto da grande indústria mostra bem a força da cerveja mineira.
— Meu produto principal ainda é a cachaça, mas cada dia chega mais gente aqui procurando cervejas locais. A que mais vende é a Wäls Dubbel — conta Carlos Henrique de Menezes, proprietário da Cachaçaria Barroca, a única que vende cervejas especiais no mercado.

O campeão de vendas de Menezes é atualmente o maior orgulho dos cervejeiros mineiros. A Wäls Dubbel foi eleita a melhor dubbel (estilo de ale belga que leva o dobro de malte que o normal) do mundo na prestigiada World Beer Cup, em maio, disputada em Denver. Na mesma competição a Wäls levou a prata na categoria quadrupel. Um dos resultados da conquista é o movimento na cervejaria, que fica em uma zona industrial perto da Lagoa da Pampulha. Todo sábado, a Wäls abre as portas de seu tasting room, onde se pode provar a produção da casa, que nunca tem menos de dez tipos de chope. Além da dubbel,vale a pena a Saison de Caipira, feita com cana-de-açúcar, numa receita em parceria com o mestre cervejeiro Garrett Oliver, da Brooklyn Brewery, de Nova York.
Os nova-iorquinos são uma inspiração para os mineiros, tanto no bar (em ambos, compra-se fichinhas para trocar por bebidas) quanto na efusiva visita guiada à fábrica, feita por José Felipe Carneiro, um dos sócios e mestre cervejeiro. Ele assume a tarefa de “beertequizar” os visitantes, mostrando cada etapa do processo. O tour termina na lojinha, onde é difícil resistir entre tantos rótulos, como a Wäls Brut, uma Belgian Strong Ale com levedura de champanhe fermentada na garrafa pelo método champenoise.
Carneiro acredita que o processo de baixa fermentação usado em suas principais receitas ajuda na fama de “Bélgica brasileira”. Mas vê na variedade de estilos o real motivo do apelido e o grande trunfo da cena mineira:
— Ao contrário de Santa Catarina e sua herança alemã, em Minas Gerais não temos influência mais forte de nenhuma escola, por isso nos dedicamos a todas.
O modelo da Wäls é uma inspiração para outras cervejarias locais. A Bäcker irá abrir em sua fábrica, no bairro Olhos D’Água, em setembro, um restaurante. Foi o que a Cervejaria Küd fez há dois meses, ao apostar no Brew Pub Küd, área para receber os clientes em sua fábrica, onde o lema “cerveja e rock’n’roll” é levado a sério. Os tonéis da linha de produção levam nomes de bandas como Pink Floyd, Beatles, Nirvana, Ramones, Sex Pistols e Black Sabbath. Neles são feitas bebidas também com inspiração roqueira, como a Smoke In The Water, uma ale defumada; a Blackbird, uma black IPA com quatro maltes e quatro estágios de lupulagem, e a Kashmir, India Pale Ale que vai muito bem com a moela ao molho de cerveja servida na casa.
A Küd fica no bairro Jardim Canadá, no município vizinho de Nova Lima. Graças a uma mudança no ordenamento urbano da cidade, algumas zonas residenciais agora podem abrigar pequenas atividades industriais. Foi assim que o Jardim Canadá se transformou em uma espécie de Eldorado cervejeiro na Grande BH. A Küd é vizinha de outras fábricas, como a Taberna do Vale a Cervejaria Inconfidentes. Essa concentração deu na Uaiktoberfest, que transforma a praça principal do bairro em um pedaço de Munique todo mês de outubro.
A Krug Bier se mudou para Nova Lima quando a produção ficou grande demais para o imóvel onde a cervejaria nasceu, em 1997, no bairro São Pedro, região central de BH. Hoje, a ampla choperia, que ainda mantém os antigos tonéis como decoração, apenas vende as seis marcas da cerveja Áustria (destaque para as premiadas Export e Imperium IPA) e dos chopes da casa, que vão muito bem com petiscos mineiros, como os pasteizinhos de angu.
Na cidade que tem fama de ser a capital brasileira dos botecos, bares voltados para as cervejas especiais têm seu lugar garantido. A fila na porta do Stadt Jever, na Savassi, indica a popularidade do lugar, uma das mais antigas choperias da cidade. Hoje administrada pela Wäls, a casa combina a carta de cervejas da fábrica com um vasto cardápio alemão. Outra tradição na área é o Café Viena, que alega ter a maior carta de cervejas da América Latina, com mais de mil rótulos.
Mais com jeitão de boteco mineiro, o Adriano Imperador da Cerveja — que, apesar de se referir ao romano tem um bonequinho do ex-jogador do Flamengo junto ao balcão — é parada obrigatória. Das oito torneiras de chope costumam sair cinco produzidos na região. Para quem quer provar um pouco de cada, o bar tem uma tábua com seis copos de 200 ml.
Para percorrer as fábricas, uma boa opção são os tours cervejeiros, sempre com duas cervejarias e almoço harmonizado. No programa oferecido pela Libertas há um café da manhã na delicatessen Gusto, especializada em cervejas importadas. Curioso. Não é todo dia que alguém harmoniza weissbier com doce de leite e queijo da Serra da Canastra.

BOA PRODUÇÃO NA REGIÃO SERRANA

No Rio de Janeiro, a produção cervejeira concentra-se na Região Serrana, inclusive no que diz respeito ao turismo cervejeiro. A antiga fábrica da Bohemia já é o segundo ponto turístico mais visitado de Petrópolis. Seu museu interativo conta a história da bebida e da marca e está aberto de quarta a domingo (R$ 24, bohemia.com.br). Nas próximas duas quartas-feiras a visitação será gratuita.
Em Teresópolis, a artesanal Sankt Gallen abre sua imponente vila para visitação, com direito a degustação. A apresentação do cervejeiro Gabriel Di Martino é uma ótima introdução ao universo da bebida. O Beer Tour acontece nas tardes de sábado e domingo, custam R$ 40 por pessoa e devem ser reservados com antecedência (vilastgallen.com.br). Em Friburgo, o bar da Ranz Bier vale a visita ao distrito de Lumiar.
Volta Redonda é casa da veterana Mistura Clássica. É possível provar a bebida diretamente da fonte no pub montado na fábrica. (misturaclassica.com.br).


Fonte: http://oglobo.globo.com/estilo/boa-viagem/rotas-da-cerveja-bebida-inspira-roteiros-turisticos-tao-variados-quanto-seus-sabores-aromas-13589039

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